segunda-feira, 8 de janeiro de 2018

Carlos Ruiz Zafón - A sombra do vento

"As guerras não têm memória e ninguém se atreve a decifrá-las, até não restarem mais vozes para contar o que aconteceu, até que chega o momento em que não as reconhecemos mais e elas retornam, com outra cara e outro nome, para devorar o que restou" (p. 359)

"Mas os anos passaram em paz. Quanto mais vazio está, mais rápido o tempo passa. As vidas sem significado passam ao largo como trens que não param na estação" (p. 361)

domingo, 26 de janeiro de 2014

O coração das trevas, de Joseph Conrad

Inesperadas. Essa a qualificação das reflexões que esse livro, O coração das trevas, me trouxe... Deixarei três trechos aqui para que não se percam nos recônditos da memória:

"A conquista da terra, que significa, em grande medida, tirá-la de quem tem a cor de pele diferente ou o nariz um pouco mais achatado que o nosso, não é uma coisa bonita, quando examinamos bem. O que a redime é a ideia apenas. Uma ideia por trás dela; não um pretexto sentimental, mas uma ideia; e uma crença altruísta na ideia - alguma coisa que você pode criar, venerar e oferece sacrifícios a ela... "(p. 15).

"Vocês veem? Veem a história? Veem alguma coisa? Me parece que estou tentando lhes contar um sonho - fazendo uma tentativa inútil, porque nenhum relato de sonho pode transmitir uma sensação de sonho, aquela mistura de absurdo, surpresa e espanto numa excitação de revolta tentando se impor, aquela noção de ser tomado pelo incompreensível que é da própria essência dos sonhos...
Ele ficou em silêncio por alguns instantes.
... Não, é impossível; é impossível transmitir a sensação viva de qualquer época determinada de nossa existência - aquela que constitui a sua verdade, o seu significado, a sua essência sutil e contundente. É impossível. Vivemos, como sonhamos - sozinhos..." (p. 48-49).

"Não, não gosto de trabalho. Teria preferido ficar à toa, pensando em todas as coisas excelentes que podem ser feitas. Não gosto de trabalho - ninguém gosta -, mas gosto do que existe no trabalho - a chance de a pessoa se encontrar. Sua própria realidade - para si mesma, não para os outros - aquilo que nenhum outro homem jamais poderá saber. Eles só podem ver o espetáculo puro e simples e jamais podem dizer o que ele realmente significa" (p.51-52)


Agora é rumar para a segunda parte do livro em busca de mais!

sexta-feira, 9 de março de 2012

Foro de Eleição e Consumidor

Veio-me uma pergunta sobre o famoso foro de eleição nos contratos de adesão. Tema interessante e cheio de nuances!

De regra, tem-se que cláusula de eleição de foro em contrato de adesão é considerada nula quando o consumidor demonstra ser hipossuficiente. Entende-se que tal cláusula mina o acesso à justiça, devendo ser considerada nula e prevalecendo o foro do domicílio do consumidor (art. 101, I, do CDC). A doutrina aponta como cláusula abusiva, inserindo no aberto conceito do art. 51, IV.

Sobre o tema, basta buscar no site do STJ, foro de eleição e consumidor que muitos julgados aparecerão. Exemplificando com apenas um recente:
1. Cuidando-se de relação de consumo, consubstanciada na adesão a contrato de fornecimento de energia elétrica, prevalece, para fins de processamento de reparação de danos, o foro do domicílio do consumidor. Precedentes (AgRg no Ag 1362438).

Registro que há entendimento exigindo a demonstração da hipossuficiência mesmo em contrato de adesão:
O fato isoladamente considerado de que a relação entabulada entre as partes é de consumo não conduz à imediata conclusão de que a cláusula de eleição de foro inserida em contrato de adesão é abusiva, sendo necessário para tanto, nos termos propostos, perscrutar, no caso concreto, se o foro eleito pelas partes inviabiliza ou mesmo dificulta, de alguma forma, o acesso ao Poder Judiciário. ( Resp. 1089993, 2010)

Interessante pontuar que o STJ entende que, se o fornecedor ingressa em juízo contra o consumidor no foro eleito em contrato de adesão, deve o magistrado declinar de ofício, pois o foro do consumidor seria caso de competência absoluta. Nesse sentido, alteraçao legal recente (2006) do CPC, no art. 112, Parágrafo único: A nulidade da cláusula de eleição de foro, em contrato de adesão, pode ser declarada de ofício pelo juiz, que declinará de competência para o juízo de domicílio do réu.

PORÉM, é de se ter em conta que, sendo o consumidor autor, há entendimentos aceitando, que, caso ele queira, ingresse no foro eleito:
CONFLITO DE COMPETÊNCIA. CONTRATO BANCÁRIO. FINANCIAMENTO COM GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. FORO CONTRATUAL. AÇÃO PROPOSTA PELO CONSUMIDOR. RENÚNCIA AO FORO DO DOMICÍLIO. POSSIBILIDADE. 1. Segundo entendimento desta Corte, nas ações propostas contra o consumidor, a competência pode ser declinada de ofício para o seu domicílio, em face do disposto no art. 101, inciso I, do CDC e no parágrafo único, do art. 112, do CPC. 2. Se a autoria do feito pertence ao consumidor, contudo, permite-se a escolha do foro de eleição contratual, considerando que a norma protetiva, erigida em seu benefício, não o obriga quando puder deduzir sem prejuízo a defesa dos seus interesses fora do seu domicílio. (CC 107441, 2011)

NO ENTANTO, isso não autoriza que o consumidor simplesmente ingresse com a ação aonde quiser:
A facilitação da defesa dos direitos do consumidor em juízo possibilita que este proponha ação em seu próprio domicílio. Tal princípio não permite, porém, que o consumidor escolha, aleatoriamente, um local diverso de seu domicílio ou do domicílio do réu para o ajuizamento do processo. Correta, portanto, a decisão declinatória de foro. (Resp. 1084036, 2009).

Resumindo: a cláusula de eleição de foro em contrato de adesão pode ser considerada sim cláusula abusiva e entendido como incompetente o foro eleito, devendo o magistrado declinar de ofício. Caso seja o consumidor demandante (demonstrando hipossuficiência, conforme alguns julgados), poderia demandar no foro de seu domicílio ou no foro eleito contratualmente, mas não aonde bem entendesse aleatoriamente.

Em tempo: Apesar da existência do §4º do art. 51, possibilitando o consumidor mobilizar o Ministério Público para fazer um controle das cláusulas, é uma pena que o §3º do art. 51 (§ 3º - O Ministério Público, mediante inquérito civil, pode efetuar o controle administrativo abstrato e preventivo das cláusulas contratuais gerais, cuja decisão terá caráter geral.) e o §5º do art. 54 (§ 5º - Cópia do formulário-padrão será remetida ao Ministério Público, que, mediante inquérito civil, poderá efetuar o controle preventivo das cláusulas gerais dos contratos de adesão.) tenham sido vetados, pois que permitiriam um controle prévio de contratos-padrão, mitigando as abusividades e um sem-número de demandas repetitivas que assoberbam o judiciário.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

STJ e o Consumidor

O Informativo nº 488 trouxe interessante temática: responsabilidade das empresas que produzem bebidas alcóolicas perante seus consumidores. Certamente, em que pese a possibilidade de inversão do ônus da prova, é difícil para o consumidor comprovar cabalmente a existência deste liame fático ou nexo de causalidade entre a fornecedora de bebidas e o dano decorrente do vício do alcoolismo. No entanto, o simples argumento da Corte de que se trata de atividade lícita não parece suficiente para elidir tal pretensão, arrimada no apelo comercial das empresas de bebidas. Tema espinhoso...

RESPONSABILIDADE CIVIL. BEBIDA ALCOÓLICA.

Trata-se, na origem, de ação indenizatória por danos morais e materiais promovida pelo ora recorrido em desfavor da ora recorrente, companhia de bebidas ao fundamento de que, ao consumir, por diversos anos, conhecida marca de cachaça, tornou-se alcoólatra, circunstância que motivou a degradação de sua vida pessoal e profissional, vindo a falecer no curso da presente ação. Sustentou, nesse contexto, que a publicidade do produto da recorrente violou as disposições do CDC, notadamente quanto à correta informação sobre os malefícios decorrentes do uso de bebida alcoólica. O juiz antecipou o exame da controvérsia e julgou improcedente o pedido. Interposto recurso de apelação, o tribunal de origem, por maioria de votos, deu-lhe provimento, ao reconhecer cerceamento de defesa e, ato contínuo, anulou a sentença, determinando, por conseguinte, a produção de prova técnica médica concernente à comprovação da dependência química do recorrido. No especial, a Turma, ao prosseguir o julgamento, por maioria, deu provimento ao recurso e entendeu, entre outras questões, que, embora notórios os malefícios do consumo excessivo de bebidas alcoólicas, tal atividade é exercida dentro da legalidade, adaptando-se às recomendações da Lei n. 9.294/1996, que modificou a forma de oferecimento ao mercado consumidor de bebidas alcoólicas e não alcoólicas, ao determinar, quanto às primeiras, a necessidade de ressalva sobre os riscos do consumo exagerado do produto. Ademais, aquele que, por livre e espontânea vontade, inicia-se no consumo de bebidas alcoólicas, propagando tal hábito durante certo período de tempo, não pode, doravante, pretender atribuir responsabilidade de sua conduta ao fabricante do produto, que exerce atividade lícita e regulamentada pelo poder público. Assim, decidiu que o tribunal a quo não poderia reconhecer de ofício o cerceamento de defesa sem a prévia manifestação da parte interessada no recurso de apelação, sendo vencida, nesse ponto, a Min. Nancy Andrighi, a qual entendeu que não é possível julgar o mérito sem antes cumprir toda a escada processual. Precedente citado: REsp 886.347-RS, DJe 8/6/2010. REsp 1.261.943-SP, Rel. Min. Massami Uyeda, julgado em 22/11/2011.

STJ e o Consumidor

Novo julgado interessante no informativo nº 489 do STJ. Partindo do entendimento do julgado é possível compreender que o valor das mensalidades escolares deve ser proporcional ao serviço ofertado em horas-aula, sendo abusiva cláusula que exige o valor integral da parcela se o aluno não está cursando todas as disciplinas...

CONSUMIDOR. ISENÇÃO. PAGAMENTO. VALOR INTEGRAL DA MENSALIDADE DE DISCIPLINAS JÁ CURSADAS.

A Turma reconheceu o direito de ex-aluno do curso de medicina a abater as mensalidades pagas à faculdade sem o desconto das disciplinas que não cursou, seja decorrente daquelas em que já fora aprovado, seja daquelas isentas em razão do curso anterior. No caso, o recorrente fora reprovado em uma matéria na segunda série e em duas matérias na terceira série, bem como fora dispensado de cursar quatro disciplinas em decorrência de ter sido discente de outra faculdade de ciências sociais, contudo teve de pagar a mensalidade integral do semestre. No entendimento do Min. Relator, não é razoável exigir que o aluno pague o valor total da mensalidade, pois não há equivalência na contraprestação da recorrida, na medida em que a carga horária não é proporcional ao valor cobrado. Tal conduta fere a boa-fé objetiva, que deve reger a ação das partes da relação contratual. Destarte, a previsão contratual e/ou regimental que imponha o pagamento integral da mensalidade, independentemente do número de disciplinas que o aluno cursar, mostra-se abusiva por trazer vantagem unilateral excessiva para a fornecedora de serviço educacional. Precedentes citados: REsp 334.837-MG, DJ 20/5/2002; AgRg no Ag 906.980-GO, DJ 22/10/2007, e AgRg no Ag 774.257-MG, DJ 16/10/2006. REsp 927.457-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 13/12/2011.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Os Pensadores - Sócrates

Estou lendo a coleção dos Pensadores, um maravilhoso presente de meu tio, quando visitei São Paulo este ano. Comecei do princípio, temporalmente falando, ou seja, por Sócrates.
Muito se discute acerca da existência de Sócrates, pois que os escritos porventura existentes, tal qual Jesus Cristo, chegaram a nós apenas por intermédio de seus ouvintes e seguidores. Certo é que sua obra e seu método trazem lições de rara beleza. A forma com que os interlocutores de Sócrates são inquiridos demonstra uma fina agudez de raciocínio.
Pois bem, visando evitar que mais uma bela citação venha a esconder-se nos meandros da minha memória, compartilho-a aqui...
Sócrates ao tratar com Eutidemo, faz menção à célebre frase insculpida no Templo do Óraculo de Delfos, a saber, "Conhece-te a ti mesmo", e afirma o seguinte:

"Os que conhecem a si mesmos sabem o que lhes é útil e discernem o que podem do que não podem fazer. Realizando o que está em seu poder, conseguem o necessário e vivem felizes. Abstendo-se do que vai além de suas forças não caem no erro e evitam o insucesso. Enfim, encontrando-se em melhores condições de julgar os homens, podem, empregando-os proveitosamente, obter grandes bens e evitar grandes males. Ao contrário, os que não conhecem a si mesmos e ignoram o próprio valor não julgam melhor os homens que as coisas humanas. Não sabem nem o que lhes é devido fazer nem como fazê-lo. A respeito de tudo iludidos, deixam escapar a felicidade e precipitam na ruína. Os que agem com conhecimento de causa atingem o objetivo almejado e obtêm honra e consideração. Seus iguai regozijam-se com sua amizade. Nas derrotas buscam seus conselhos, entregam-se em suas mãos, neles depositam suas esperanças de bom êxito e por tudo isso os estimam mais que a ninguém. Já os que vivem às cegas etem-se a fazer o que não deviam, malogram em todos os empreendimentos e, castigados pelo insucesso, tornam-se objeto do desprezo e do ridículo, vivendo sob a zombaria e o desrespeito" (Sócrates. Os Pensadores. São Paulo : Nova Cultural, 1999, p. 232-233)
Tarefa difícil, porém essencial, eis a ordem do dia: Conhece-te a ti mesmo!
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terça-feira, 22 de junho de 2010

Fênix...

Eis que o blog ressurge das cinzas... E quem ajudou? O mestre Machado de Assis!

Após minha mais recente compra de livros nos sebos do Brasil (via estantevirtual.com), comecei a ler Iaiá Garcia, uma obra da fase mais romântica de Machado de Assis. Eis que leio um excerto que precisava compartilhar, uma ponderação digna de nota:
"O Sr. Antunes , que não era de extremas filosofias, tinha a convicção de que debaixo do sol, nem tudo são vaidades, como quer o Eclesiastes; nem tudo perfeições, como opina o doutor Pangloss; entendia que há larga ponderação de males e bens, e que a arte de viver consistes em tirar o maior bem do maior mal". (ASSIS, Joaquim Maria Machado de. Iaiá Garcia. São Paulo : Ática, 1998, p. 28).
Ao descrever a personagem em questão, Machado dá um bom ensinamento: Nada de extremismos! Nem tudo é vaidade, mas também nem tudo é perfeição. Tente apenas extrair o que há de melhor das piores situações. Singelo e educativo.
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